O Decreto, nº 2.568/2020, editado nesta segunda-feira (30) pelo prefeito de Palhoça, Camilo Martins, prorrogou a situação de emergência de saúde pública no município por tempo indeterminado e consolidou as medidas de prevenção e combate ao contágio pelo novo coronavírus até o dia 5 de abril. As medidas passaram a ter efeito a partir desta quarta-feira (1). Porém, algumas atividades econômicas liberadas pela Prefeitura permanecem suspensas por recomendação do governo do estado, que também nesta quarta-feira anunciou a liberação do retorno ao trabalho de toda a cadeia produtiva da área da construção civil (consideradas algumas particularidades, como as restrições de ordem sanitária, para evitar a proliferação do Covid-19); nada além disso.
O novo decreto municipal havia feito inclusões de atividades econômicas não-essenciais liberadas, em relação ao previsto no decreto anterior, o de número 2.566/2020. Agências bancárias, correspondentes bancários, lotéricas e cooperativas de crédito passaram a funcionar, a partir de 30 de março, exclusivamente para o atendimento de pessoas que necessitem de serviços presenciais, observando o disposto na Portaria 192, do secretário de Estado da Saúde, de 29 de março de 2020.
Seguiriam na mesma esteira atividades autônomas e prestadas por profissionais liberais, desde que os atendimentos fossem individuais e agendados. O decreto menciona, inclusive, como exemplo de serviços liberados, os escritórios de advocacia e contabilidade, os salões de beleza e as barbearias. Na quarta-feira (1), muitos desses serviços abriram as portas em Palhoça, aliviados pela decisão municipal. Porém, a Polícia Militar impediu o funcionamento desses espaços. Isso porque as atividades mencionadas no documento municipal não foram liberadas pelo governo do estado. O prefeito de Palhoça, Camilo Martins, afirma que havia um compromisso do governador de liberar essas atividades. Porém, o único setor liberado pelo governo do estado nesta quarta-feira (1) foi o da construção civil.
O governador Carlos Moisés anunciou, à tarde, a liberação das obras privadas de construção civil e de toda a sua cadeia produtiva em Santa Catarina. A decisão foi oficializada por meio da Portaria 214, publicada no Diário Oficial do Estado e que passa a valer a partir desta quinta-feira (2). A retomada do setor foi determinada após uma reunião de trabalho do Núcleo Econômico, que engloba a equipe do governo do estado, as principais entidades do setor produtivo e representantes do Parlamento, da Federação dos Municípios (Fecam) e do Ministério Público.
Segundo o governador, a liberação proporciona um tratamento igualitário ao setor da construção civil, uma vez que as obras públicas já haviam sido retomadas no começo da semana. Carlos Moisés salienta que as empresas precisarão respeitar as normas de distanciamento social e de liberação do trabalho de pessoas do grupo de risco. “Nós concluímos que havia um tratamento desigual e precisávamos distensionar o setor da construção civil. A decisão vai nesse sentido. As empresas precisarão respeitar as normas estabelecidas pelo governo do estado. A retomada gradativa das atividades precisa ocorrer de forma segura e as reuniões do Núcleo Econômico nos levam a ter mais estabilidade na tomada das decisões”, afirmou o governador.
A portaria determina também a liberação do funcionamento dos estabelecimentos comerciais de materiais de construção, ferragens, ferramentas, material elétrico, cimento, tintas, vernizes e materiais para pintura, mármores, granitos e pedras de revestimento, vidros, espelhos e vitrais, madeira e artefatos, materiais hidráulicos, cal, areia, pedra britada, tijolos e telhas.
O chefe da Casa Civil, Douglas Borba, salientou que as decisões tomadas pelo Núcleo Econômico serão soberanas, com a participação de todos os entes, tanto públicos quanto privados. “Estamos buscando um equilíbrio das ações. As condições sanitárias serão respeitadas e todas as decisões preservarão a saúde dos catarinenses, com intensa fiscalização”, frisou.
O grupo de trabalho do Núcleo Econômico se reúne diariamente, sempre às 14h. Além do governador, participaram da reunião desta quarta-feira a vice-governadora, Daniela Reinehr; o chefe da Casa Civil, Douglas Borba; os secretários Paulo Eli (Fazenda), Lucas Esmeraldino (Desenvolvimento Econômico), João Batista Cordeiro Junior (Defesa Civil), Jorge Eduardo Tasca (Administração) e Ricardo Gouvêa (Agricultura e Pesca); o comandante-geral da PM/SC, Carlos Alberto de Araújo Gomes; o presidente da Fiesc, Mario Cezar Aguiar; o presidente da Fecoagro, Cláudio Post; o presidente da Fecomércio-SC, Bruno Breithaupt; o presidente da FCDL, Ivan Roberto; o presidente da Facisc, Jonny Zulauf; o presidente da Fampesc, Alcides Andrade; o presidente da Faesc, José Zeferino Pedrozo; os deputados estaduais Paulinha e Valdir Cobalchini; o procurador-chefe do MPF, Darlan Dias; o procurador do MP/SC Giovanni Gil; o procurador-chefe do MPT, Marcelo Goss; e a prefeita Adeliana Dal Pont, de São José, representando a Fecam.
Em pronunciamento seguido de entrevista divulgados ao vivo no canal do governo do estado no YouTube, na tarde desta quarta-feira, o governador confirmou a liberação da construção civil e disse que a liberação de outras atividades estão sendo estudadas pelo Núcleo Econômico, mas não há nenhuma previsão concreta, por enquanto, para novas liberações.
A decisão frustra a expectativa de muitos empresários palhocenses, que chegaram a abrir suas portas nesta quarta-feira, mas foram novamente impedidos de trabalhar. “Vamos avaliar para ver o que vamos fazer”, disse o prefeito Camilo Martins, após a decisão do governo do estado.
Estão mantidos serviços considerados essenciais, como: tratamento e abastecimento de água; geração, transmissão e distribuição de energia elétrica; gás e combustíveis; assistência de saúde incluindo a médica, hospitalar e laboratórios; distribuição e comercialização de medicamentos e gêneros alimentícios, como farmácias, supermercados, mercados, padarias, açougues, peixarias, conveniências e hortifrutigranjeiros; funerários e crematórios; captação e tratamento de esgoto; recolhimento de lixo; telecomunicações; processamento de dados ligados a serviços essenciais; segurança privada; manufatura e transporte de medicamentos e produtos para a saúde; produção e transporte de alimentos; agropecuárias, pet shops e congêneres; serviços de oficinas mecânicas, borracharias e afins; serviços de guincho; análise, inspeção e certificação de bens e produtos, assim como serviços e atividades relacionadas à obras públicas e privadas relacionados a atividades ou serviços essenciais; manutenção de elevadores; cartórios.
Em todos esses serviços, fica estabelecido o controle e limitação de ocupação de 50% do espaço do local, a necessidade de distanciamento de pelo menos 1,5 metro entre pessoas e o reforço das medidas de higiene e asseio.
Conflito de decretos
O conflito de decretos nas esferas federal, estadual e municipal é mais um capítulo da saga do Covid-19 no país. A questão gira em torno das competências constitucionais de cada ente da federação (União, estados-membros e municípios). A Constituição Federal de 1988 estabelece, no artigo 21, competências exclusivas da União, e no artigo 22, as competências legislativas privativas, o que revela o relevante papel de coordenação deste ente nacional. No artigo 23, há as competências comuns: União, estados e municípios podem tratar de assuntos como saúde, políticas educacionais, etc. “Portanto, há um modelo de federalismo cooperativo”, explica Eliane Luiz Espíndola de Souza, mestre em Gestão de Políticas Públicas, professora de Direito Constitucional e Direito Administrativo na Unisul.
Eliane informa que o artigo 24 traz a competência concorrente, onde a União é o ente competente para editar as normas gerais; os estados e municípios criam normas específicas que não podem contrariar as normas gerais. Quando a União não cria a norma geral, os estados podem criar, até que haja a edição da norma geral da União. “A questão está no problema atual, os entes da Federação estão em dissonância, e isso gera insegurança”, reflete a professora. “Então, no caso dos municípios, a competência legislativa sempre será de interesse local, não podendo, entretanto, contrariar normas gerais como as expedidas pelo estado de Santa Catarina. Quando um município não atende uma norma geral que se refere à segurança sanitária, de interesse nacional, o ente maior pode impor. Então, o município poderia criar normas mais restritivas, não de maior liberdade”, finaliza a professora, indicando que o chefe do Poder Executivo municipal pode procurar o Judiciário se pretende questionar a constitucionalidade do decreto estadual.
O Grupo de Apoio à Execução do Gabinete Gestor de Crise do Ministério Público de SC (MP/SC) elaborou uma orientação aos promotores de Justiça sobre os limites da atuação dos prefeitos municipais na implantação das medidas de restrição de circulação e de isolamento social para conter a Covid-19. A conclusão é a de que as medidas dos decretos estaduais são o mínimo a ser adotado e prefeitos só podem ser mais rigorosos. O que não é o caso, pois a medida do estado é que é a mais restritiva.
Os prefeitos podem determinar "a adoção de medidas de distanciamento social, incluindo a restrição de atividades e o trânsito de pessoas no território", desde que essas iniciativas, da competência da autoridade de saúde municipal, sejam tomadas com base em critérios sanitários definidos pelo órgão responsável por essa área. Além disso, o município só pode, ainda, propor medidas até mais restritivas do que as determinadas pelos decretos federais e estaduais de emergência - desde que não firam a Lei nº 13.979/2020, da União, que estipula o que deve ser feito para combater a Covid-19 - nem interfiram em direitos fundamentais.
Nos municípios, a aplicação dessas medidas resulta em fechamentos parciais de acessos às cidades, barreiras sanitárias, autorização de funcionamento ou proibição de serviços, obras, comércio, transporte coletivo, escolas e uma série de atividades.
A principal motivação desse estudo, que resultou em uma orientação aos Promotores de Justiça, foi reunir uma base legal que sustente, de maneira uniforme e segura, a atuação das autoridades sanitárias municipais nos esforços para reduzir a circulação de pessoas e promover o isolamento social.