Por: Sofia Mayer*
Não foram só as luvas, máscaras e jalecos que apresentaram um aumento de valor expressivo neste ano, em função da pandemia. Profissionais do setor mobiliário relatam que os preços das matérias-primas essenciais para o trabalho chegaram a subir mais de 100% em 2020.
De acordo com a palhocense Scheyla Claudiano, que trabalha com marcenaria, o preço da chapa de MDF saltou de R$ 115 para R$ 240 em dois meses. “Estão aumentando toda semana. Falam que não tem chapa e que, quando chegar, terá novo reajuste”, comenta. O temor é de um possível desemprego em massa, já que os profissionais trabalham, sobretudo, para a classe média: “Com esses valores não vamos conseguir clientes, pois não terão condições de pagar o valor justo pelo nosso cansativo, criativo e engenhoso trabalho”.
Até mesmo chapas antigas estão sendo vendidas por preços altos: “Como eu sei disso? É simples: a Duratex não vende mais chapa com as duas faces coloridas e eles estão entregando as antigas”, relata. O acréscimo estaria acontecendo também com espelhos e ferragens.
Para Scheyla, os aumentos são injustificados e abrangem diferentes materiais. “Eu pagava 11 reais na cola, agora estão vendendo por 19 reais. No final, dá uma diferença muito alta nos orçamentos”, descreve. Com preços aumentando durante todo o ano, ela conta que agora está se adaptando à situação: “Mas eles não podem fazer isto, é muita cara de pau. Quem tem cliente pequeno, que é a maioria, vai quebrar”.
De acordo com o Procon em Palhoça, não houve notificações relacionadas a aumento abusivo nos valores das matérias-primas.
Insatisfação é geral
Em um grupo de marceneiros em uma rede social, uma popular comentou que a escassez tem ficado cada vez pior. “Hoje, fui limitada a comprar 10 MDFs no máximo, e cinco no mínimo. Além disso, só liberaram agora eu comprar um valor de R$ 700 em outros materiais. Achei isso um absurdo. Alguém mais tá passando por isso? Fora que está superdifícil fechar contrato por causa dos valores, clientes deixando para o ano que vem”, afirmou.
Outro profissional aproveitou para reclamar dos preços: “MDF de 15 mm a mais de R$ 200. Ferragens também supercaras. Somos obrigados a passar orçamento bem mais alto. Resultado: cliente desiste de fechar”.
SIM confirma aumento
O Sindicato da Indústria do Mobiliário (SIM) na Grande Florianópolis afirma que os preços das matérias-primas subiram de forma avassaladora. “O aumento de 20% é em virtude da pandemia, e 80% por conta do alto valor do dólar no mercado interno. A exportação se tornou extremamente atraente, com recebimento antecipado”, explica o primeiro-secretário da instituição, Jaymor Carlos Marcon.
Segundo ele, a China aumentou, desde fevereiro, em 700% a aquisição do MDF, que é a base de todos os padrões de cores e texturas. Já os Estados Unidos teriam alavancado em 600%. Nesse cenário, sobra menos para o consumo local, colocando os preços nas alturas.
Faturamento na pandemia
Apesar das reclamações da classe, a Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina (Fiesc) afirma que, de janeiro a outubro, a indústria catarinense tem registrado recuperação no faturamento. O serviço de madeiras e móveis, por exemplo, teria crescido 7,3%. O consumo de alimentos e bebidas cresceu ainda mais, apresentando um acréscimo de 23,4%. “A análise mostra que, como consequência das medidas de isolamento social, o padrão de consumo da população brasileira mudou. Aumentaram as compras de alimentos e bebidas e isso se refletiu nas vendas deste setor, que registrou o melhor desempenho entre os avaliados. Com a população passando mais tempo em suas casas, também cresceu o mercado de itens como eletrodomésticos e móveis e madeira”, disse o presidente da Fiesc.
A informação vai ao encontro a dados do IBGE, que revelam que, em outubro, a produção de móveis do Brasil ficou 8% superior ao período pré-pandemia.
Materiais utilizados na saúde
Quem trabalha com materiais usualmente utilizados pelos profissionais da saúde também tem sentido os impactos no bolso. É o caso da manicure Carla Schafer, que não encontra mais caixas de luva por menos de R$ 70. Antes da pandemia, o mesmo produto costumava ser adquirido por R$ 18,90, afirma a profissional. Carla atua em um salão de beleza no bairro Jardim Eldorado.
O artefato funcionava também para se proteger da Covid-19. “Não dá mais para usar. Paguei 70 reais há duas semanas, e dizem que agora está 90”, lamenta. Foi só interromper o uso, contudo, que a manicure contraiu a doença. “Imagina: eu uso uma caixa por 10 dias. Às vezes, dura uma semana. Não existe condições de seguir usando. Aí, confiei no álcool, mas claramente ele não é tão eficaz quanto o EPI”, pondera.
Com a corrida de estados para planos de vacinação, representantes de setores responsáveis pela fabricação desses produtos temem, em caso de falta de planejamento governamental, falta de insumos básicos, como seringas, algodão, caixa térmica, saco plástico e luvas descartáveis.
* Sob a supervisão de Alexandre Bonfim
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