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MP e DPE ajuízam ação pedindo lockdown de 14 dias

Ministério Público e Defensoria Pública do Estado querem a extensão das restrições adotadas nos finais de semana

ceea5b4c924ba3d121f129b6b7af3fbd.png Foto: REPRODUÇÃO/INTERNET

Diante do atual cenário de colapso do sistema de saúde, com filas de mais de 400 pacientes por leitos de UTI, com diversos hospitais fechando seus pronto-atendimentos e uma média de óbitos por leito de UTI de 64%, a Promotoria de Justiça da Saúde do Ministério Público de Santa Catarina (MP/SC) e a Defensoria Pública do Estado (DPE) ajuizaram, na noite desta quarta-feira (10), ação civil pública (ACP) com pedido de tutela de urgência para que o estado estenda as restrições dos finais de semana por 14 dias contínuos, sem prejuízo de outras restrições de atividades que entenda possíveis e necessárias à maior eficiência da medida, em especial com relação a atividades industriais.

Caso a liminar seja deferida e não cumprida, o MP/SC e a DPE requerem fixação de multa pessoal no valor de R$ 50.000 por dia de descumprimento, ao secretário de Estado da Saúde e ao governador do estado de Santa Catarina.

Cientes de que essa medida trará consequências para os setores econômicos, a ACP, protocolada na 2ª Vara da Fazenda Pública da Capital, busca, também, que o estado apresente plano econômico de socorro emergencial e compensatório para minimizar o impacto aos segmentos e pessoas físicas diretamente afetados pelas restrições de funcionamento, principalmente às microempresas, empresas de pequeno porte e profissionais autônomos e liberais.

O MP argumenta que técnicos e especialistas recomendam a necessidade de promover restrições que durem pelo menos 14 dias para quebrar o ciclo de transmissão do vírus. Por isso, a ação requer que o estado tenha, em 48 horas, um plano de ação de fiscalização das medidas de restrição de circulação que serão implementadas, envolvendo a atuação dos órgãos identificados nos artigos 3º e 5º do Decreto Estadual 1.172/2021.

 

Coes

A ação busca, ainda, que o estado recomponha a equipe técnica de médicos e demais profissionais da saúde que fazem a análise dos cenários epidemiológicos relacionados à pandemia e recomendação de ações necessárias com base em "evidências científicas e em análises sobre as informações estratégicas em saúde", como exigido pelo artigo 3º, parágrafo 1º, da Lei 13.979/2020; bem como que os pareceres elaborados por essa equipe sejam de conhecimento público ou, no mínimo, juntados semanalmente aos autos.

De acordo com a ação, o plano de retomada gradual e segura das atividades deve ser apresentado em sete dias, contendo avaliação e recomendações da equipe técnica da Secretaria de Estado da Saúde sobre o momento, com análise técnica do cenário epidemiológico e melhora nas taxas de casos novos e ocupação de leitos, no intuito de evitar novo descontrole da transmissão.

 

ACP após recomendação e monitoramento

A ação civil pública, que tem o objetivo de restabelecer a condução da política pública de enfrentamento da Covid-19 fundamentada na ciência e, especialmente, nas recomendações de seu corpo técnico, foi ajuizada após o Executivo estadual não acatar recomendação expedida de forma conjunta pelos órgãos de controle de fiscalização do estado e o Gabinete Gestor de Crise do MP/SC avaliar que as medidas do governo adotadas somente nos finais de semana não foram suficientes para conter o avanço da pandemia, aliviar a pressão sobre o sistema hospitalar e garantir atendimento adequado de saúde a todos os catarinenses. E as medidas anunciadas nesta quarta-feira (10) também não demonstram efetividade, na avaliação do Ministério Público.

A ação judicial está estruturada em sete tópicos, que abordam todo o cenário atual da pandemia no estado, e tem como base depoimentos de médicos e epidemiologistas da própria Secretária de Estado da Saúde, manifestações de diversas entidades e parecer técnico do Tribunal de Contas do Estado.  

 

Avanços da pandemia

De acordo com a ação, a última atualização da avaliação de risco potencial, cuja matriz foi publicada no dia 6 de março, apresenta, pela segunda semana consecutiva, todas as 16 regiões em grau de risco potencial gravíssimo e com avaliação de quase todos os respectivos indicadores no patamar máximo.

Os boletins epidemiológicos divulgados pelo estado de Santa Catarina demonstram que, na última semana (entre 1º e 7 de março), foram confirmados, em média, mais de 5.271 casos por dia, ao passo que na semana anterior (22 a 28 de fevereiro) esse número foi de 4.517 por dia. E dados extraídos em 9 de março do painel de BI da Secretaria de Estado da Saúde, disponibilizado na plataforma Boavista, demonstram que apenas no Lacen existem 8.934 testes aguardando liberação, o que demonstra o recebimento de amostras muito superior à capacidade de processamento.

Dados extraídos nesta quarta-feira (10) de painel de BI da Secretaria de Estado da Saúde demonstram, ainda, que existem 40.760 casos ativos em Santa Catarina e um total de 710.307 casos confirmados, maior número já registrado no estado desde o início da pandemia (havendo, ainda, uma quantidade enorme de exames represados aguardando por resultado).

Esse aumento aconteceu de forma bastante acelerada, uma vez que há pouco mais de um mês, conforme boletim epidemiológico de 24 de janeiro, o número de casos ativo era de 16.731. E, ainda, antes do verão, conforme boletim epidemiológico de 16 de outubro, o número de casos ativos era de 7.677.

 

Óbitos

A ação demonstra, ainda, que, em apenas 55 dias de 2021, ocorreram 1.742 mortes em Santa Catarina, o que equivale a 32,4% de todas as mortes ocorridas em 2020 (10 meses contabilizados a partir do primeiro óbito). E esse número está lamentavelmente crescendo vertiginosamente nos últimos dias, reflexo do colapso do sistema hospitalar, sendo registradas 450 mortes na semana retrasada (de 22 de fevereiro - 6.988 óbitos registrados - a 1º de março - 7.438 óbitos registrados), média de 64 óbitos por dia, e 624 mortes na última semana (de 1º de março - 7.438 óbitos registrados - a 8 de março - 8.062 óbitos registrados), média de 89 óbitos por dia.

"Esses números altíssimos não são novidades para o gestor. O crescimento acelerado dos casos já vem sendo observado ao longo das últimas semanas, resultado do verão, ainda que o maior impacto sobre o sistema hospitalar e número de óbitos tenha ocorrido mais recentemente", ressaltam os autores da ação, promotores de Justiça Luciano Trierweiller Naschenweng, com atuação na saúde em âmbito estadual; Douglas Roberto Martins, coordenador do Centro de Apoio Operacional dos Direitos Humanos e Terceiro Setor (CDH); e o defensor público-geral do estado, Renan Soares de Souza, e defensora pública do estado, Ana Paula Berlatto Fão Fischer.

Ressalta-se, ainda, que matriz de avaliação de risco potencial não vem sendo considerada pelos gestores estaduais e municipais em suas tomadas de decisão, considerando que o objetivo do instrumento é alertar para indicadores de atenção que permitam antecipar situações de maior gravidade e adotar medidas para evitá-la. 

 

Estados vizinhos

Na ação, o MP/SC e a DPE comparam o atual cenário catarinense com os dos estados vizinhos, Paraná e Rio Grande do Sul. Os números revelam que, apesar de uma situação de colapso do sistema hospitalar proporcionalmente menor do que o do estado de Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul implementaram medidas significativamente mais restritivas e de impacto na circulação de pessoas, atendendo à recomendação de seus comitês técnicos. 

"O colapso do sistema hospitalar de Santa Catarina é maior proporcionalmente do que o dos estados vizinhos. Não obstante, as medidas adotadas estão aquém das implementados pelos respectivos governos estaduais", refletem os signatários da ação.

Conforme boletim divulgado no dia 9, o estado do Paraná conta com 1.506 leitos de UTI Adulto SUS exclusivos para pacientes com Covid, dos quais 1.438 estão ocupados e 68 vagos, o que resulta em uma taxa de ocupação de 95%. A ocupação de leitos de UTI Adulto SUS para pacientes com outros agravos está em apenas 66% naquele estado (1.088 existentes e 718 ocupados).

O estado do Rio Grande do Sul, por sua vez, não separa no painel de dados os leitos de UTI exclusivo Covid dos leitos de UTI Geral. Conforme o sistema, dos 2.211 leitos de UTI Adulto SUS do estado, 2.119 estão ocupados, o que representa uma taxa de ocupação de 95,8%. 

A rede privada apresenta taxa de ocupação dos leitos de UTI Adulto de 124,2%. Dados do dia 4/3 apontavam para a existência de 288 pacientes aguardando por leito de UTI Adulto SUS no estado, o que corresponde a cerca de 13% dos leitos existentes.

Segundo dados desta terça-feira (9), Santa Catarina tem 1.309 leitos de UTI Adulto no SUS, dos quais 840 exclusivos para pacientes com Covid, estando com 100% deles ocupados. Na mesma data, são 395 pessoas aguardando por vaga em leito de UTI Covid, o que corresponde a 47% do total de leitos do estado destinados para esses pacientes.

 

Dignidade da pessoa humana

A adoção ou não de medidas de distanciamento social é atribuição exclusiva da autoridade sanitária e do chefe do respectivo Poder Executivo, porém, devem fazê-lo sempre com base nas necessárias "evidências científicas" e "análises sobre as informações estratégicas em saúde", conforme exige o parágrafo 1º do artigo 3º da Lei 13.979/2020.

Porém, o MP entende que o exponencial crescimento das curvas de infecções, hospitalizações, internações graves e óbitos já não permite que se trate o atual cenário apenas como uma crise da pandemia, mas como um colapso generalizado do sistema público de saúde no estado. O atual momento afronta diretamente o princípio da dignidade da pessoa humana, na avaliação dos signatários da ação. "Não se trata mais de adotar ações preventivas. Sequer incidem os princípios da precaução ou da prevenção, considerando que o dano já está acontecendo, com o colapso do sistema de saúde que impossibilita atendimento integral, universal e igualitário a todos os cidadãos catarinenses", ressalta o promotor de Justiça.

Estão submetidos a filas de espera mais de 400 pessoas aguardando por vaga em leito de UTI. "Trata-se, neste momento, portanto, de medida impositiva a intervenção imediata na circulação de pessoas, sem margens para experimentação de medidas parciais, dado que o erro custará ainda mais vidas", expressa o MP.

 

Economia

Os esforços do estado de preservação da economia geraram resultados bastante positivos, comemorados amplamente, com recordes de arrecadação nos últimos meses de 2020 e 15% de crescimento no mês de janeiro de 2021 em comparação com o mesmo mês do ano anterior. 

No momento, portanto, é necessário reconhecer que a saúde e a dignidade da pessoas precisam ser preservadas. Dessa forma, medidas de apoio aos estabelecimentos e profissionais atingidos pela providência são essenciais à manutenção da dignidade dessas pessoas. 

No estado do Rio Grande do Sul, por exemplo, que adotou medidas restritivas, estabeleceu ações para minimizar os impactos de eventuais restrições aos setores produtivos, fomentando a continuidade dos negócios e a preservação de empregos e de renda. 

"O estado de Santa Catarina possui excelente corpo técnico-tributário, que será capaz de avaliar as medidas possíveis a partir da interpretação dos inúmeros dispositivos trazidos pela legislação extravagante, pela adesão e replicação de convênios do Confaz hoje existentes ou mesmo a oferta de medidas insertas no artigo 151 do Código Tributário Nacional, como, por exemplo, a moratória, que poderá ser restringida especificamente aos principais setores atingidos", ressaltam os autores da ação.



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