O setor esportivo é um dos mais afetados pelas medidas de afastamento social propostas pelas autoridades públicas para o enfrentamento à pandemia do novo coronavírus. Com competições paralisadas e treinos suspensos, os protagonistas do esporte buscam alternativas para manter a forma física, enquanto esperam pelo desdobramento do combate à Covid-19.
Na sexta-feira (17), a Associação de Clubes de Futebol Profissional de Santa Catarina construiu um protocolo de saúde e um plano de ação para viabilizar, com segurança e portões fechados, o retorno do Campeonato Catarinense a partir de 16 de maio. A expectativa dos dirigentes - e da própria Federação Catarinense de Futebol - é a de que o governo do estado encaminhe uma resposta positiva à solicitação.
O protocolo de saúde é um documento de 27 páginas elaborado pelo médico Luis Fernando Funchal (Avaí), com a participação do infectologista Valter Rotolo da Costa Araújo. O dossiê detalha todas as ações que devem ser realizadas num clube, com procedimentos específicos para cada setor: da enfermaria à academia de ginástica; dos ambientes de concentração ao transporte dos jogadores para viagens, entre outros.
O Guarani de Palhoça, que vai disputar a Série B do Estadual, também aguarda a definição das datas da Segundona para realizar seu planejamento. Por enquanto, o clube está de portas fechadas. A garotada das categorias de base foi liberada para ficar junto de seus familiares.
Por falar em garotada, a quarentena atinge também as escolinhas. “A situação está bem delicada”, diz o treinador João Batista “Mancha”, que comanda o elogiado projeto de revelação e formação de talentos do CFA Manchister. “O Projeto do Manchister, desde 2005 não sofria um baque tão grande. A gente sempre trabalhou no limite. Nosso projeto nunca foi de fins lucrativos altos, é de sobrevivência mesmo. Sempre fizemos o trabalho social por conta, sem apoio nenhum, onde a gente tem a questão das escolinhas sustentando o rendimento e alguns do rendimento que também podem contribuir mantêm o projeto”, acrescenta Mancha.
Mancha lamenta que o poder público não valorize o trabalho técnico e social que é realizado pelo Manchister e revela que a escolinha é sua única fonte de renda. “Com esta quarentena, perdi tudo. A gente não tem nem como cobrar mensalidade de atletas, até porque a maioria dos pais está com algum tipo de problema e a realidade é a mesma que a minha. Fiquei desassistido neste momento. Entendo a gravidade, espero que isso passe logo, mas estou apavorado”, lamenta o treinador.
Judô
O judô é outro exemplo de esporte impactado pela pandemia. Em Porto Alegre (RS), os treinos da atleta palhocense Nathalia Parisoto foram suspensos a partir do dia 23 de março. A princípio, tinham sido suspensas todas as competições até o dia 30 de abril. Em seguida, foram cancelados outros eventos, como o Brasileiro Regional, competição que envolve os estados do RS, SC, PR e SP. “Com certeza, atrapalha bastante nós, atletas, pelo fato de não conseguirmos manter um nível elevado de treinamento. O objetivo nesse período de quarentena é ter a menor perda possível. Perda essa de massa muscular, condicionamento cardiovascular; a parte específica, que é o judô, terá perdas consequentemente, mas por ter uma carga de treinamento de longos anos, é recuperada mais rapidamente depois. A questão é mais a parte física”, observa a atleta.
A palhocense é acompanhada pelo preparador físico Rodrigo Dallaqua, presidente da Federação Estadual de Levantamento de Peso do RS, que conseguiu aparelhagem para que a atleta pudesse treinar em casa. Assim, Nathalia tem o “privilégio” de ter uma barra, anilhas e suporte de agachamento para poder fazer exercícios em casa. “Estou tentando manter uma rotina de treinos como se estivesse em dias normais. Junto disso, tenho seguido com acompanhamento psicológico, que tem sido essencial nesse período. É muito difícil perder todo aquele gasto de energia que tinha por dia. Tem que saber lidar”, receita.
Como a maioria dos atletas no Brasil neste momento, Nathalia não faz ideia de quando as competições retornarão. Até porque o judô é um esporte de contato, em que os atletas ficam bastante expostos a um contágio. Quando retornarem as atividades, a expectativa é a de que haja um “nivelamento” maior, já que todos os atletas vão precisar encarar a quarentena. “A parte ‘positiva’ disso tudo é que estão todas na mesma. Então, é um momento onde os grandes atletas não têm o diferencial, que são os treinamentos de campo internacionais, as competições internacionais. É um momento de equiparar, de chegar próximo deles e partir todos de um mesmo nível”, diz a palhocense, que é a atual terceira colocada no ranking nacional da categoria meio pesado, até 78kg.
Devido ao afastamento dos tatames por conta de uma lesão (retornou às competições apenas no segundo semestre do ano passado), Nathalia ainda não tem uma colocação considerável no ranking internacional. Mas isso é questão de tempo. Focada na Olimpíada de 2024, em Paris, na França, a palhocense mantém a forma e segue as orientações dos técnicos Rafael Garcia e Leandro Freire, que diariamente passam treinos adaptados para a parte técnica de judô. “Meu foco é Paris 2024. É pra lá que irei buscar minha vaga”, projeta a atleta, que concordou com a decisão das autoridades japonesas de adiar a Olimpíada de Tóquio, que estava marcada para o segundo semestre deste ano. “O adiamento das Olimpíadas foi essencial. Não para mim, pois é difícil mudar algo na equipe que vai disputar. Apesar de não estar totalmente definida, são alguns poucos atletas que estavam em disputa direta com outro que terão mais essa ‘chance’ pra buscar a vaga.
Mas via como necessário o adiamento para que tivéssemos o grande espetáculo, para que os atletas chegassem no nível ótimo de performance. E se fosse agora, muitos não estariam nem treinando”, reflete. “Achei que foi exatamente o que tinha que acontecer! Não tem como haver um campeonato tão importante, que as pessoas se preparam por anos e anos, se, nos meses que antecedem, os treinos têm que estar sendo improvisados. Mesmo que em agosto as coisas já estivessem normalizadas pra acontecer o evento, não tem condições, iria prejudicar o sonho de muitos por conta de não ter tido como treinar. Além disso, é a saúde de todos, reunir tanta gente de países diferentes seria irresponsabilidade, a atitude do COI (Comitê Olímpico Internacional) foi perfeita e sensata”, reflete outra judoca de Palhoça, Pietra Antun, que mora e treina no Rio de Janeiro.
Pietra conta que seus treinos foram suspensos no dia 13 de março. Ela também participaria do Brasileiro Regional, que aconteceria neste final de semana (começaria no sábado, 25). Também foram cancelados a Taça Brasil Sub-21 e o Brasileiro Final Sub-21. Mesmo assim, Pietra trabalha em casa para manter a forma. “Manter a forma como era antes está difícil, pois somos acostumados com treinos pesados, e mesmo tentando se adaptar, não é igual. Porém, tenho feito treinos em casa que são passados pela comissão técnica do Instituto Reação pra gente não ficar parado”, conta a atleta.
A incerteza com relação ao reinício das atividades “normais” é o que deixa os atletas mais angustiados neste momento. “A gente sempre pensa: só mais quinze dias. Aí, depois: só mais quinze dias, só mais quinze dias... e assim vão passando os meses. É difícil, dá uma ansiedade, uma agonia, mas temos que esperar e ficar em casa, pro bem-estar de todo mundo e pra esse pesadelo acabar logo e tudo voltar ao normal”, argumenta Pietra, que completa 19 anos em dezembro.
Velocidade
No mundo da velocidade, a mesma coisa: nada de acelerar por enquanto. A única marcha engatada é a da ansiedade. Na SuperBike, o Brasileiro de motovelocidade - que neste ano teria 10 etapas, pela primeira vez (vinha sendo disputado em oito provas) - teve a primeira etapa, que seria no dia 26 de março, cancelada. A segunda etapa, marcada para o final de abril, também foi suspensa. “A gente está com esperança de que a terceira etapa, marcada para maio, seja mantida”, conta o piloto Pablo Gomes, que mora em Palhoça.
A organização está pensando em projetar as etapas canceladas para o segundo semestre ou mesmo realizar etapas duplas, para finalizar o calendário deste ano. “Mas o campeonato vai se realizar, com certeza”, confia Pablo. “Nem que seja de portões fechados”, completa.
Para o piloto, a pandemia atrapalha os planos dos pilotos, das equipes e dos patrocinadores, diretamente. “O esporte vive de público”, contextualiza Pablo. E sem público, é difícil de manter patrocinadores. “Mas eu creio que com bastante fé em Deus e bastante dedicação a gente vai conseguir dar a volta por cima e 2020 ainda vai transcorrer de forma positiva e que a gente possa fazer esse campeonato se realizar. Antes, era o quinto maior campeonato do mundo de motovelocidade, e hoje é o quarto maior, um evento de proporção gigantesca”, define o piloto.
E como todos os pilotos, atualmente, são atletas e cuidam muito da preparação física, Pablo segue treinando fisicamente duas vezes por dia, até para recuperar a forma perdida depois de 15 dias de confinamento total em casa. “Perdi muito do meu preparo em razão disso”, avalia.
Mesma situação do piloto palhocense de rali Ricardo Martins, que voltou de uma viagem aos Estados Unidos em março e cumpriu 14 dias de quarentena em isolamento, em casa. Menos mal que conseguiu montar uma academia doméstica, e agora, quando começa o relaxamento das medidas restritivas no estado, começa a correr e a pedalar. “Tu pode treinar em academia e fazer o que for, mas o importante é andar com a moto”, reflete o piloto, que foi orientado a não pilotar neste período de quarentena. “A gente foi orientado a treinar a parte física em casa e evitar um pouco a moto, para evitar o risco de acidente e ter que ir para o hospital e usar um leito de forma desnecessária e ainda correr o risco de se contaminar”, relata.
A apresentação da equipe seria no mês de março e foi cancelada, assim como corridas previstas para Rio Grande do Norte, São Paulo e Rio de Janeiro, neste início de temporada. Ricardo espera que em maio as coisas “se acalmem” e a partir de junho a temporada seja retomada. Com uma corrida por mês, daria para “compactar” o campeonato e cumprir o calendário ainda este ano. “Os organizadores estão avaliando para ver como vai ficar”, observa.
Surfe
Com os decretos proibindo a circulação de pessoas nas praias, o surfe também foi prejudicado. A estrela do surfe palhocense, Tainá Hinckel, conta que mesmo antes da pandemia já estava focando na preparação física em academia. “Antes mesmo do coronavírus eu tinha tirado um tempo para cuidar um pouco mais do meu físico. Então, eu estava treinando diariamente em Floripa, na academia Aktion Paz, na verdade um centro de reabilitação, então eu venho há um tempo sem surfar. Em isolamento, mesmo, faz praticamente um mês e um pouquinho”, relata Tainá.
As competições da World Surf League (WSL), em que a atleta competiria, foram canceladas até o final de maio, e ainda não há uma definição sobre o restante da temporada. Enquanto aguarda pelo novo calendário, Tainá tem mantido a alimentação saudável que costuma seguir e tem feito exercícios orientados pela fisioterapeuta. “Não tenho surfado e não sei quando vou voltar a surfar. Tô deixando acontecer e tirando o tempo para focar mais em outras partes para voltar melhor ainda”, revela a atleta, que está passando por esse período de isolamento social na Guarda do Embaú.
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