Mesmo com a inclusão, divulgada nesta quinta-feira (26), de atividades religiosas no grupo dos serviços essenciais no Brasil - aqueles com permissão para funcionar durante a quarentena de isolamento contra o coronavírus (Covid-19) -, a ordem do estado de Santa Catarina continua sendo de evitar aglomerações. Ainda nesta quinta, ao apresentar um plano estratégico para retomada das atividades econômicas no estado, o governador Carlos Moisés reiterou que reuniões presenciais de caráter religioso seguem suspensas em âmbito estadual. Em Palhoça, líderes apoiam a decisão e adaptam suas celebrações aos moldes virtuais.
A resposta da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) à alteração do decreto federal foi rápida. Em nota, o presidente da instituição, que congrega os bispos da Igreja Católica no país, reforçou o apelo para que as pessoas não saiam de casa, e lembrou dos alertas feitos pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em relação ao crescimento acelerado da pandemia. Em Palhoça, as portas das igrejas católicas seguem fechadas, em cumprimento à orientação hierárquica da igreja e às indicações do governo estadual. As missas continuarão sendo realizadas de forma privada, e transmitidas pelas redes sociais durante o período de quarentena.
Apesar da inclusão das atividades religiosas na lista de serviços essenciais, a partir do Decreto Federal 10.292/2020, a Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB) em Palhoça também segue as recomendações do estado. Na comunidade do Centro, cultos e medidas de assistência a membros e pessoas da cidade estão acontecendo por meio de plataformas digitais. “Em casos específicos, que necessitam da presença física dos pastores e pastora, são tomados todos os cuidados recomendados pelas autoridades da saúde e da Organização Mundial da Saúde”, afirma o pastor Wilhelm Sell.
Em meio aos casos crescentes da Covid-19 em Santa Catarina, o pastor ressalta a importância da igreja de cuidar do bem-estar da sociedade. “Somos críticos às igrejas que, visando arrecadações financeiras, abrirão suas portas para cultos públicos presenciais, possibilitando a disseminação do vírus e, assim, promovendo o sacrifício da vida de pessoas. O discurso piedoso que chama irresponsavelmente as pessoas a se aglutinarem é um atentado contra o próprio Deus”, afirma. Sell ressalta a recomendação de ficar em casa e cuidar das pessoas mais vulneráveis à doença.
Com atividades presenciais impedidas, a aposta da Assembleia de Deus também são os cultos com transmissão online, através do Facebook e do canal da igreja no YouTube. O pastor Marcelo Bedinot afirma que manter as reuniões, mesmo que de forma remota, ajuda a transmitir, aos fiéis, palavras de conforto no momento de crise. No momento, as congregações estão abertas, nos dias e horários de cultos, apenas para aconselhamento pastoral e orações.
A comunidade vai ao encontro às diretrizes da Convenção das Igrejas Evangélicas Assembléia de Deus de Santa Catarina e Sudoeste do Paraná (Ciadescp), que tem aconselhado as igrejas a manter as portas fechadas, pelo menos durante a quarentena proposta pelo governador Carlos Moisés. “No momento em que forem abertos comércio e restaurantes, vamos ver como ficarão as igrejas, pois temos recebido muita gente, até de maioria não evangélica, pedindo orações e aconselhamento”, conta o presidente da convenção, pastor Nilton dos Santos. Em coletiva realizada no fim da tarde desta quinta-feira (26), o governador do estado apresentou um plano estratégico, que prevê a retomada de serviços não essenciais na próxima quarta (1), mediante restrições de funcionamento. Shoppings, academias e restaurantes estão inclusos.
O presidente da Ciadescp prevê que, assim que os serviços retomarem ao nível de “quase normalidade”, as igrejas voltem a abrir para um público de até 30% de sua capacidade. Santos ressalta, porém, que as próximas medidas anunciadas pelo governador serão essenciais para as definições.
Adaptação e oportunidade em meio à crise
Líderes da igreja evangélica Palavra Viva, localizada no Aririú, apoiam a posição do governo de Santa Catarina e apostam na criatividade para manter a conexão com os fiéis em tempos de quarentena. A partir de transmissões ao vivo, com uma boa estrutura de captação de áudio e vídeo, membros afirmam que as celebrações online têm alcançado um número significativo de pessoas. “É mais uma ferramenta a ser estudada”, afirma Karine Andrade, membro da igreja há pelo menos cinco anos.
O pastor da unidade, João Antunes, conta que apenas duas ou três pessoas se reúnem para realizar as gravações, o suficiente para garantir, simultaneamente, mão de obra para o funcionamento das transmissões e o bem-estar dos colaboradores. Já nas redes sociais, os líderes têm feito campanhas para alcançar a comunidade através de suas necessidades reais. “Lançamos um trabalho de voluntariado com idosos, gestantes e pessoas portadoras de necessidades especiais para buscar coisas na farmácia e compras (no mercado)”, completa.
“Temos outras maneiras de fazê-la essencial”
As atividades do Núcleo Espírita Chico Xavier, de Palhoça, têm se adaptado aos serviços online desde o primeiro decreto anunciado pelo governador, no dia 17 de março, que orienta a população à quarentena de isolamento social. Mesmo com a inclusão das atividades religiosas no grupo dos serviços essenciais, o grupo seguirá as orientações estaduais, mantendo os contatos físicos restritos a partir de encontros via Facebook, Instagram e YouTube. “Mesmo que o governo federal a coloque como atividade essencial, temos outras maneiras de fazê-la essencial”, justifica a presidente do núcleo, Rosana Ponche.
Ponche afirma que manter as atividades, mesmo que remotamente, é imprescindível neste momento de crise: “O público que nos acompanha é formado por pessoas de várias necessidades, com processos depressivos, síndrome de pânico, desequilíbrios emocionais, problemas familiares. Eles dependem muito do equilíbrio, da palavra de conforto, da orientação que a gente dá semanalmente”. O núcleo conta, hoje, com cerca de 80 participantes.
O presidente do Centro Espírita Humildade e Fé, José Carlos, afirma que a instituição seguirá as recomendações dos órgãos de saúde enquanto o Covid-19 estiver circulando no estado. Com sede na Ponte do Imaruim, o centro está focando apenas nas atividades remotas. “Mesmo nas atividades online, há vários pedidos de ajuda, que estamos atendendo com orações a distância”, contextualiza. Carlos assegura que, quando as atividades presenciais retornarem, haverá ainda muitas restrições e cuidados.
Em nota aos Dirigentes Espíritas de Santa Catarina, em 18 de março, a Federação Espírita Catarinense (FEC) reforçou a importância da prevenção contra o Covid-19: “É nosso dever atender todas as recomendações dos órgãos públicos, a fim de colaborar com a campanha de prevenção para, num esforço coletivo, determos a curva de contaminação do vírus”.
Nos terreiros e casas de Axé, o foco é a prevenção
No terreiro da mãe de santo Raquel da Cunha, em Palhoça, as atividades só devem retornar quando o grupo sentir que o Covid-19 não representa mais perigo na região. “Eu não tenho coragem de colocar os médiuns em risco, de contrair e levar para algum ente querido. Então, nós também temos que pesar isso”, afirma.
As medidas de prevenção são bem aceitas em outros terreiros de Umbanda na cidade. Em geral, a suspensão das atividades e isolamento social são consenso entre consulentes e médiuns. Na Tenda Espírita Cabocla Iracema, do Caminho Novo, por exemplo, mensagens em apoio às orientações do Ministério da Saúde e de órgãos internacionais estão em destaque nas redes sociais. A ordem é ficar em casa.
Em um espaço de Candomblé em Palhoça, todas as funções foram suspensas há 15 dias, a partir de orientações do babalorixá e de entidades que trabalham na casa. “O babalorixá é profissional da saúde, é técnico de enfermagem e estudante de enfermagem”, explica Leonardo Kretzer, ogan na casa. As funções que estavam marcadas para este período foram adiadas até que o quadro de disseminação do coronavírus seja estabilizado.
Kretzer ressalta, ainda, a importância do isolamento no cenário atual: “O espaço de uma Casa de Axé, enquanto local de acolhimento, convívio social, culto de ancestralidade e tradição, é um espaço de convívio geracional, possuindo algumas pessoas da terceira idade, crianças e adultos. Constitui um espaço de disseminação em potencial”.