Por: Sofia Mayer*
A prevenção não é “o melhor remédio”, simplesmente, em um enfrentamento de uma pandemia como a do novo coronavírus (Covid-19). Prevenir pode, de fato, significar o salvaguardo de vidas humanas. É um período extremo, que exige medidas extremas, e a sociedade precisa se ajustar à realidade do isolamento social, medida considerada como imprescindível para minimizar a propagação de um vírus com uma alta taxa de contágio como o esse. De olho na expansão da pandemia, o governador Carlos Moisés decretou, na noite de terça-feira (17), uma série de ações restritivas, referendadas nesta quarta (18) pelo prefeito de Palhoça, Camilo Martins. Medidas como a que determina que serviços não essenciais (como comércios, academias e restaurantes) devam ficar fechados por sete dias trouxeram efeitos contundentes ao cotidiano dos palhocenses.
O comércio amanheceu na incerteza: fechar as portas ou não? A Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) orientou os empresários a atender ao decreto, e aos poucos, com o apoio da Polícia Militar, que foi às ruas para garantir que as medidas fossem respeitadas, o comércio fechou as portas. Às 17h de ontem, a avenida Barão do Rio Branco, uma das mais movimentadas do Centro, nem lembrava uma rua de tráfego intenso de veículos e pedestres na hora do rush.
O “rush” apenas mudou de endereço, na verdade: foi para as portas dos supermercados. Mesmo que a tese do isolamento social seja, justamente, evitar aglomeramentos, muitos palhocenses correram aos supermercados, que tiveram uma quarta-feira de superlotação – mesmo que as medidas restritivas não se apliquem ao setor, ou seja, as portas vão continuar abertas e (pelo menos por enquanto) não há previsão de desabastecimento.
Com lojas fechadas, a Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas de Santa Catarina (FCDL) divulgou, em nota, que espera medidas de apoio do governo à economia, em paralelo ao decreto sancionado por Carlos Moisés, como a possibilidade de parcelamento e/ou postergação de tributos e de serviços fornecidos por empresas públicas (água, energia, etc.) e outras exercidas pelo estado.
O empresário palhocense Fabiano Henrique Milian considera as ações restritivas do governo necessárias, mas crê que suas consequências serão devastadoras para os pequenos comércios. “O comércio necessita de ações municipais e federais para postergar os impostos, bem como de ações federais para liberar dinheiro do FGTS para reativar a economia após essa quarentena. Agora, sim, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) seria altamente importante em emprestar, a juros baixos, dinheiro para os pequenos comércios ou até através da Caixa Econômica Federal”, propõe.
Na esteira da criatividade
Algumas empresas da cidade buscam alternativas para manter as atividades nesse período de exceção e minimizar os prejuízos.
A suspensão das atividades em academias foi uma da série de medidas divulgadas pelo governador Carlos Moisés. Pensando em controlar a crise que o decreto deve trazer, uma rede de academias de Palhoça, com quase 5 mil alunos, está trabalhando na criação de produtos alternativos, que não coloquem em risco a saúde dos clientes e funcionários, mas que permitam que o nome da empresa siga sendo ouvido nas redondezas. “Vamos criar um programa ao vivo, onde daremos informações, dicas de alimentação e também exercícios físicos de forma online, para que as pessoas consigam fazer em casa”, explica Eduardo Luiz Martins, proprietário da rede.
Para a produção desses materiais, Martins assegura que todas as precauções necessárias estão sendo tomadas para garantir um ambiente seguro contra o vírus. A direção da academia afirma, ainda, que o período de 15 dias com portas fechadas será bonificado ao final do contrato de cada aluno.
Na onda crescente de quarentena e isolamentos, outras empresas têm apostado no trabalho remoto. A designer Sônia Klann, empregada em uma e-commerce de moda gestante, conta que foi liberada pelos chefes para fazer home office durante a crise do Covid-19, e diz que a empresa chegou a permitir que os funcionários levassem os computadores para casa. “A gente está falando por vídeo-chamada com a equipe e resolvendo as coisas por WhatsApp”, diz, explicando a dinâmica do trabalho. A jovem conta que algumas medidas adotadas pela empresa, como o acompanhamento das demandas de trabalho via aplicativo, ajudam a tornar o home office mais viável. “Geralmente, a gente bota as atividades no (aplicativo) Monday, e coisas mais urgentes a gente fala pelo WhatsApp. Dessa forma, a gente está em contato com todo mundo, resolvendo o que vai ser postado, como a gente vai prosseguir”, conclui.
Sônia Klann admite a importância do plano para o controle da pandemia, porém, ainda carrega algumas preocupações, tendo em vista que a transmissão comunitária do vírus pelo estado já é uma realidade. “Na empresa do meu marido, que trabalha em hospital, eles não liberaram (os funcionários). Então, tem esse receio: às vezes uma pessoa consegue o home office e a outra não, e, assim, acaba podendo estar contaminando também”, desabafa.
Serviços autônomos
Para quem não tem a opção de trabalhar remotamente, como a manicure Carla Schafer, a situação é mais complicada. O salão em que presta serviços, localizado no Jardim Eldorado, deve ficar, conforme decreto do governador, fechado por sete dias. “Por enquanto, nesse período, vou ficar sem receber um centavo”, afirma.
Nas redes sociais, campanhas estão rolando para conscientizar pessoas com salário fixo a continuar pagando pelos serviços de autônomos que costumam usufruir mensalmente - como diaristas, terapeutas, manicures e professores particulares. Schafer acredita que a situação é mais complexa: “Nossos clientes também vão sofrer as consequências, então provavelmente vão cortar gastos de tudo, e a gente também não vai receber. E aí, as nossas contas é jogar para Deus”. Além de fazer serviços isolados, a manicure trabalha com pacotes mensais, que vão de R$ 75 a R$ 110.
Até mesmo para quem já praticava o trabalho remoto, como a jornalista Natália Pinho, a rotina mudou com o início das medidas de isolamento social. “Como eu já trabalhava de home office, pra mim, a questão do trabalho não mudou, mas eu ia todo dia de bicicleta para a academia e estava fazendo Inglês”, explica. Mesmo em época de expansão do coronavírus, a prestadora de serviços acredita que home office é luxo. “Eu sou muito privilegiada em poder trabalhar em casa e a gente sabe que tem gente que não pode”, pondera.
Delivery em alta
No tradicional restaurante de Alexandre da Rosa, o sistema de delivery já existia como um incremento das vendas. Diante deste novo quadro, porém, a entrega de pedidos passou a ser a única opção para a comercialização dos produtos. Antes, o restaurante contava com duas linhas de produção: uma para o delivery - com apenas uma pessoa trabalhando -, e outra para o salão, com uma equipe de cinco funcionários. “Agora, a gente vai colocar todo mundo no delivery. Embalagem, forma de entrega, tudo isso muda”, explica.
Embora Rosa acredite que a empresa tenha o diferencial de entregar refeições completas, ele prevê que o sistema de entregas não será suficiente para suprir o prejuízo do restaurante fechado. Para dar conta do novo modelo de trabalho, Rosa teve que ainda que aumentar a quantidade de motoboys.
A notícia da pandemia chegando ao estado pegou o proprietário de surpresa, porém, ele admite a importância das medidas restritivas. Na cozinha grande, de 200 metros quadrados, não há espaço para aglomerações, e todos trabalham usando máscaras descartáveis. “Álcool em gel em todos os lados, motoboys todos trabalhando com máscara”, completa.
Projeto Dorcas pede ajuda
Não é apenas o setor terciário que sente as consequências da quarentena. O Projeto Dorcas, de Palhoça, é uma iniciativa desenvolvida por voluntários, e teme que suas crianças fiquem sem refeições durante a expansão do coronavírus. Por isso, o grupo abriu uma vaquinha voluntária para tentar minimizar os problemas decorrentes das medidas de isolamento. Para contribuir com qualquer valor, acesse o link bit.ly/2x32t73.
Segundo o projeto, as famílias com maiores necessidades já foram mapeadas e receberão um crédito para retirarem alimentos em mercados e minimercados.
* Sob a supervisão de Luciano Smanioto