IMAGEM: REPRODUÇÃO DA OBRA DE OLAVO PACHECO
Cântico à velha Palhoça – Parte I
Vivo a lembrar minha infância
Em Palhoça nasci e me criei
É o melhor lugar do mundo
Dela muitas histórias contei
Ainda que eu viva cem anos
Iria gastá-los só contando
As muitas histórias que sei.
Palhoça é meu lugar
De fina hospitalidade
Aqui sempre quis morar
Nunca quis outra cidade.
Um a um aqui tinha nome
Gato, cachorro e homem
Era lugar sem maldade.
Os dias eram sonolentos
Horas passavam vagarosas
O relógio só trabalhava
À custa de muita prosa.
Tartaruga aqui era atleta
Existiam algumas bicicletas
Mas o transporte era a carroça.
Os carros motorizados
Contava nos dedos da mão
Alguns veículos pequenos
E um ou outro caminhão.
Que desbravavam picadas
E iam abrindo as estradas
Dando vazão à produção.
Poucos viviam na cidade
Muitos na zona rural
Em quase toda residência
Tinha galinheiro e curral.
Também chiqueiro de porco
Fazia-se de tudo um pouco
Vivia-se bem ganhando mal.
Aos domingos de manhã
A mesma cena se repete
Ir à missa na Igreja Matriz
Assistir à missa das sete.
A criançada fazia graça
Ao desembarcar na praça
Das carroças ou das charretes.
A igreja ficava cheia
O padre dava o sermão
Ficava todo mundo ligado
No que dizia o padre João.
Pedíamos pra ele o céu eterno
Tínhamos medo do inferno
Precisávamos de seu perdão.
Depois de assistir à missa
Os homens iam beber “tatuzinho”
Mas papai pedia uma média
E para nós, uns biscoitinhos.
Acabava-se o jejum da exaltação
Imposta pela comunhão
Lá no bar do seu Dorinho.
Quando tinha condições
Papai botava na mesa
Feita pelo seu Juliano Luchi
Uma garrafa de framboesa.
Aquela bebida gostosa
Deixava a criançada prosa
Delícia de sobremesa.
Então, íamos para o jardim
Que cheirava a alfazema
Ver o Tavinho e o Ireno
Alheios a todo sistema.
Dois cidadãos de quilates
O Ireno, “grande engraxate”
O Tavinho, “dono do cinema”.
Em volta da Praça Sete
Papai então dava um giro
Ia comprar ferramentas
No Armazém do Casemiro.
Considerava-se um sortudo
Pois no Armazém tinha tudo
Pra roça, pesca e tiro.
Enquanto no jardim corríamos
Atropelando os pedestres
Éramos observados de perto
Por entre os pés de ciprestes.
Era o seu Flor e o seu Néca
Que mesmo recebendo merreca
Em jardinagem eram mestres.
Sempre depois de cada missa
Por entre as flores a sorrir
Via-se fazendo campanha
O palhocense Zamir.
Pedia o voto pro papai
Dizia: “Desta vez, vai
Espere a urna se abrir”.
E caminhando pelo Centro
Já com pressa nessa altura
Papai ia comprar remédio
Pra dor de cabeça e gastura.
Entrava na Farmácia do Chico
Que receitava “salamoníaco”
E comprimidos de Alicura.
Mas antes de ir pra casa
Papai comprava bala Azedinha
E também pães quentinhos
Na padaria do seu Zequinha.
E avisava para o Bastião
Que não ia querer o pão
Que vendia de carrocinha.
Nas festas de Espírito Santo
Todos iam ao Cortejo Imperial
Na Loja de dona Ivone Weiss
As moças compravam enxoval.
O belo terno de linho
E camisa com colarinho
Só no seu Rolde tinha igual.
Sentado no banco da praça
Via-se o Coca passar
Com uma carroça de lenha
Para em Florianópolis entregar.
Orgulhoso com seu ganho
Instigava o cavalo Zanho
Para mais rápido lá chegar.
Era na rua do Mercado
Que batíamos fotografia
O Gedalvo fotografava
A Palhoça do dia a dia.
Fosse foto três por quatro
Ou da família um retrato
Era ele quem batia.
Ver o seu Juarez Nahas
Com o guarda-chuva na mão
Andando a pé pela cidade
Ele nos transmitia proteção.
Era bom ver o promotor
Que mesmo sendo um doutor
Misturava-se com o povão.
Vivíamos em segurança
Era pequena a delegacia
Também eram poucos
Os escritórios de advocacia.
Os advogados de bom nome:
José João e Nereu Ghizoni
As questões de terras resolviam.
Os policiais da nossa delegacia
Obedeciam a um bom regime
Treinavam pra usar revolver
Defendendo a lei com pulso firme.
Homem de bem vivia sem culpa
Estacionar na Praça não dava multa
A Policia agia no combate ao crime.
Publicado em 05/12/2024 - por Beltrano